3.7.08

Há bem escrever sobre publicidade. What else?

Há dias tive o privilégio de ler, mais que uma vez, confesso, um texto a propósito de publicidade, mais objectivamente àcerca de um anúncio de televisão a uma máquina de café. Perguntava quem o escreveu, se não há boa publicidade sem um bom produto, para a seguir afirmar com uma convicção que as palavras escritas fazem prova, que na sua opinião o anúncio em causa era excelente. Comentei no momento, procurando não me alongar por estar em casa alheia, e mencionei a intenção de abordar o assunto aqui, onde posso dar largas à paixão que sinto pela profissão que abracei e não tendo que me sentir culpado ou inconveniente por ter a sensação que estou a perder uma capacidade que considero vital. O poder de bem resumir. Há boa publicidade com um bom produto e com um mau produto. E há má publicidade independentemente do produto ser bom ou mau. Não tenho a pretensão de pensar que o texto escrito foi motivado por uma frase que disse em tempos, mas ficou claro que essa frase influenciou, e ainda bem, o que tão bem foi escrito. The magic is on the product, foi dito por um dos criadores de anúncios mais famosos da história da publicidade. E com essa frase estabelecia-se a fronteira entre arte e publicidade. O que me fascinou no texto que li, foi a abstracção e o lúcido distanciamento do objectivo último que os propósitos da publicidade servem. Vender. Mas para se comprar um produto, mesmo tratando-se da compra mais racional, é necessário desejá-lo. E para o desejar temos que nos identificar com ele. E para nos identificarmos com ele, o apelo é, quase sempre, pela via emocional. Por isso, muitas vezes de tanto ser desejado, respeitado e admirado, até pagamos mais por ele. Creio ser o caso. A máquina de café em causa deixou de ser uma simples máquina que faz esse líquido precioso de que o texto nos fala de uma forma envolvente, para passar a ser algo que ultrapassa a funcionalidade e um objecto que, de repente é visto como tendo carácter, personalidade, alma. O actor ajuda, dir-me-ão os mais desavisados, esquecendo-se que é aquele actor, escolhido a dedo, que nos transporta para um universo único, levando com ele o produto. Entre todos os meus amigos que têm uma máquina Nespresso, as mulheres ou namoradas, tiveram um papel decisivo na compra da máquina. Os outros, costumo dizer, bem sei que levianamente e sem que me levem a sério, são metrosexuais. Eu não tenho nem creio vir a ter uma Nespresso. Mas sei que assim será até que alguém justifique que a vontade seja feita. Quanto ao texto que aqui me trouxe, não pude deixar de me deliciar com facto de ler um retrato do actor em quase cada uma das palavras que nos fala de café e do seu ritual. De nenhum tratado se trata o que aqui escrevi mas neste caso há boa publicidade com um bom produto, mas também há quem a torne ainda mais sedutora sem ser publicitário. Apenas por escrever bem. What else? escrever muito bem.

11 comentários:

ana v. disse...

Falou o publicitário, está tudo dito. E concordo que o magnífico texto da Luísa faria inveja ao copy mais sofisticado e experiente... está lá tudo!
Também não tenho uma Nespresso, e acho que só comprarei uma quando trouxer o George Clooney como brinde. Mas deixe-me dizer-lhe, Mike, que acho que esta sua escolha da fotografia não foi nada inocente... é a pior dele que eu tenho visto!

-JÚLIA MOURA LOPES- disse...

:-)

um bomproduto quase não precisará de Publicidade. Ele define-se a si próprio, o publicitário só terá que o definir.

Neste caso, teve que se recriar, conferir-lhe qualidades. Qual das duas tarefas será a mais dificil para o publicitário?...

ana v. disse...

Um bom produto só tem a ganhar com boa publicidade, que o dá a conhecer melhor e mais depressa. É preciso é que a reacção do consumidor seja uma confirmação das expectativas criadas, por isso os maus produtos se arruínam com uma publicidade que leva ao desejo de uma coisa que depois decepciona.

Luísa A. disse...

Meu caro Mike, não era preciso! :-)
Mas ajudou-me a compreender os riscos da aplicação de boa publicidade a maus produtos. Lembro-me de que, em miúda, achava a publicidade ao Martini fascinante… até que provei e houve todo um imaginário que ruiu como um baralho de cartas. A sua publicidade mais recente, com um ligeiro travo mafioso, parece-me francamente mais adequada. :-)
Obrigada.

Anónimo disse...

Ana, eu não gosto e evito abordar e escrever sobre o tema. Mas que a escolha da foto não foi inocente, ah isso não foi... (risos)

Júlia, a tarefa mais difícil é encontrar A ideia. :)

Luísa, bem sei que não era preciso, mas gostei de escrever o que escrevi. :)
Ora, com uma miúda a beber Martini não há publicidade que resista... (risos)

-JÚLIA MOURA LOPES- disse...

realmente a Ana tem razão, a foto foi a sua vingança, o homem está irreconhecivel, que pontaria!!

Anónimo disse...

É para verem que os "pedaços" também têm os seus (maus) dias, ora... :P

O Réprobo disse...

Meu Caro Mike,
este texto é brilhante e fica muito bem emparelhado com o que lhe deu origem.
Quanto ao nó do problema, introduziria uma nuance: qundo há uma sandwich e o produto publicitado finge anunciar outro para desfrutar de uma promoção, caso os dois elementos que o ladeiam sejam bons, consegue vingar sofrivelmente e fazer-se perdoar por ser uma nulidade.
Demonstração: entalado entre a excelência da máquina de café e do texto da Luísa, Clooney até passa.
Abraço

Anónimo disse...

Caro Réprobo, não posso estar mais de acordo com a demonstração mencionada. :)
Abraço.

José, o Alfredo disse...

Para quem aprecia profundamente o café, para quem não se fica pela forma (a forma do Clooney, os anúncios, as maquinetas, as cores das pastilhas, a camada de espuma) e desce ao nível do café propriamente dito, é natural que o Nespresso não corresponda às hiper-expectativas criadas pela overdose de forma. É que o café é essencialmente diferente daquele que estamos mais habituados a apreciar em Portugal: os Nespressos são à base de Arabica, todos sem excepção (a torra provavelmente também, mas sobre essa não sei objectivamente qual é a escola de pensamento da Nestlé).

O engraçado da situação nem é que os Arabicas se imponham num país de supostos adoradores de Robusta. É que toda a gente seja capaz de falar horas a fio sobre a Nespresso sem sequer tocar nesse assunto. Where else?

(Este comentário abatanado também se encontra no Nocturno. Dou mais uns GRPs ao comentário e as pessoas que já tiverem lido aqui escusam de ler lá, e vice-versa...)

Anónimo disse...

José, comentário apropriado, o que outra coisa não seria de esperar vindo de um publicitário experiente e da área criativa. Fiquei no entanto com uma dúvida: tens uma Nespresso?
Abraço.

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